MP 1.202/2023 e a indevida limitação da compensação de créditos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado

Em 29 de dezembro de 2023, foi publicada a Medida Provisória nº 1.202/2023, que trouxe importantes alterações na legislação tributária visando “resguardar a arrecadação federal”, conforme exposto na sua própria Exposição de Motivos, tais como (i) a limitação da compensação de créditos decorrentes de decisões judiciais; (ii) a revogação da desoneração da folha de salários e (iii) a revogação de benefícios fiscais concedidos ao setor de eventos no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).

 

No tocante à limitação da compensação de créditos decorrentes de decisões judiciais, que será tratado neste memorando, a referida MP alterou as disposições contidas no art. 74 da Lei nº 9.430/96 para restringir, de forma indevida, a compensação de crédito advindo de ação judicial transitada em julgado em valor igual ou superior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).

 

De acordo com a MP, a compensação será limitada mensalmente, de acordo com ato do Ministério da Fazenda a ser editado, observada graduação em função do valor do crédito, que não poderá ser inferior a 1/60 (um sessenta avos) do montante total demonstrado e atualizado na data da entrega da primeira Declaração de Compensação (DCOMP).

 

A referida MP acrescentou também o inciso “X” ao parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, dispondo que não poderá ser objeto de DCOMP “o valor do crédito utilizado na compensação que superar o limite mensal de que trata o art. 74-A”.

 

Dessa forma, se o contribuinte compensar, via DCOMP, valor superior ao limite mensal que será futuramente fixado, o valor excedente será considerado como “não declarada”, nos termos do inciso I do parágrafo 12 do referido artigo. Como consequência, o débito compensado “indevidamente” será inscrito em dívida ativa, na medida em que eventual defesa administrativa, nessa hipótese, não possui efeito suspensivo.

 

No entanto, entendemos que há sólidos argumentos jurídicos para afastar as inconstitucionais e ilegais restrições trazidas pela referida MP.

 

De fato, o próprio STF possui o entendimento reiterado quanto a impossibilidade de a Fazenda Pública estabelecer regras criando entraves para o cumprimento de decisões judiciais transitadas em julgado. A título exemplificativo, destacam-se os recentes julgamentos proferidos nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) nºs 7.064 e 7047, julgadas em 01/12/2023. Nessas ações, os Ministros entenderam, por maioria de votos, pela inconstitucionalidade das Emendas Constitucionais nº 113 e 114, as quais previam a postergação do pagamento dos precatórios a partir de determinado valor.

 

Além disso, a limitação prevista na referida MP viola diversos princípios constitucionais, com destaque para a isonomia tributária (na medida em que a restrição não se aplica a todas as modalidades de créditos passíveis de compensação, mas apenas aqueles decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado), além dos princípios da coisa julgada material e da moralidade administrativa.

 

Não bastasse as notáveis inconstitucionalidades, o legislador ordinário não poderia ter delegado a disciplina da matéria à ato infralegal nem tampouco aplicar a limitação para créditos decorrentes de ações ajuizadas antes desta surpreendente MP.

 

O escritório Freitas e Vieira Advogados está atento ao tema e a regulamentação que será expedida pelo Ministério da Fazenda e se coloca à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários.

Equipe Freitas e Vieira Advogados
Freitas Vieira
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